“Eu já disse que a capacidade de nos surpreendermos é a única coisa de que precisamos para nos tornarmos bons filósofos? Se não o disse, digo-o agora: A CAPACIDADE DE NOS SURPREENDERMOS É A ÚNICA COISA DE QUE PRECISAMOS PARA NOS TORNARMOS BONS FILÓSOFOS.
Todas as crianças pequenas possuem essa capacidade, isso é óbvio. Com poucos meses de vida, começam a aperceber-se de uma realidade completamente nova. Mas quando crescem, esta capacidade parece diminuir. Qual será o motivo? (...).
Será a minha tarefa impedir que tu (...) te tornes uma daquelas pessoas para quem o mundo é evidente. (...)
Aparentemente, perdemos durante a nossa infância a capacidade de nos surpreendermos com o mundo. Mas com isso, perdemos algo essencial – algo que os filósofos querem reavivar. Porque em nós algo nos diz que a vida é um grande mistério. Já tivemos essa sensação muito antes de termos aprendido a pensar nisso.
Vou ser mais preciso: apesar de todas as questões filosóficas dizerem respeito a todos os homens, nem todos os homens se tornam filósofos. Por diversos motivos, a maior parte está presa de tal forma ao quotidiano que o espanto perante a vida é muito escasso. (...).
Para as crianças, o mundo – e tudo o que existe nele – é uma coisa nova, uma coisa que provoca estupefacção. Os adultos não o vêem assim. A maior parte dos adultos vê o mundo como qualquer coisa completamente normal.
Os filósofos constituem uma excepção notável. Um filósofo nunca se conseguiu habituar completamente ao mundo. Para um filósofo ou para uma filósofa o mundo é ainda imcompreensível, inclusivamente enigmático e misterioso. Os filósofos e as crianças pequenas possuem uma importante qualidade em comum. Podes dizer que um filósofo permace durante toda a sua vida tão capaz de se surpreender como uma criança pequena.
E agora tens que te decidir, (...): és uma criança que ainda não se habituou ao mundo? Ou és um(a) filósofo(a) que pode jurar que isso nunca lhe acontecerá?
Se abanas a cabeça e não te sentes nem como criança nem como filósofo(a), é porque te acostumaste tão bem ao mundo que este já não te surpreende. Nesse caso o perigo está eminente. Por isso te ofereço este curso de filosofia, para prevenir. Não quero que tu pertenças à categoria dos apáticos e dos indiferentes. Quero que vivas a tua vida de modo consciente.”
Jostein Gaarder, O Mundo de Sofia, Ed. Presença, pags.21-23
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